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quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Ah, o amor


AH, O AMOR

“Às folhas tantas do livro de matemática,
um quociente apaixonou-se um dia doidamente por uma incógnita.
Olhou-a com seu olhar inumerável e viu-a, do ápice à base.
Uma figura ímpar olhos romboides, boca trapezoide, corpo ortogonal, seios esferoides.
Fez da sua uma vida paralela a dela até que se encontraram no infinito.
“Quem és tu?” – indagou ele com ânsia radical.
“Eu sou a soma dos quadrados dos catetos, mas pode me chamar de hipotenusa”.
E de falarem descobriram que eram o que, em aritmética, corresponde a almas irmãs, primos entre si.
E assim se amaram ao quadrado da velocidade da luz numa sexta potenciação traçando ao sabor do momento e da paixão retas, curvas, círculos e linhas senoidais.
Nos jardins da quarta dimensão, escandalizaram os ortodoxos das fórmulas euclidianas e os exegetas do universo finito.
Romperam convenções Newtonianas e Pitagóricas e, enfim, resolveram se casar, constituir um lar mais que um lar, uma perpendicular. Convidaram os padrinhos: o poliedro e a bissetriz, e fizeram os planos, equações e diagramas para o futuro, sonhando com uma felicidade integral e diferencial.
E se casaram e tiveram uma secante e três cones muito engraçadinhos e foram felizes até aquele dia em que tudo, afinal, vira monotonia.
Foi então que surgiu o máximo divisor comum, frequentador de círculos concêntricos viciosos, ofereceu-lhe, a ela, uma grandeza absoluta e reduziu-a a um denominador comum. Ele, quociente percebeu que com ela não formava mais um todo, uma unidade.
Era o triângulo tanto chamado amoroso desse problema, ele era a fração mais ordinária.
Mas foi então que Einstein descobriu a relatividade e tudo que era espúrio passou a ser moralidade, como, aliás, em qualquer Sociedade…”
Millôr Fernandes

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